Entrevista a Yemi Awosile
Cortiça transformada em tecido têxtil
Yemi Awosile é uma designer têxtil e de materiais residente em Londres. O coração do seu trabalho explora a identidade e tradição dos materiais com significado social e com fortes ligações ao ambiente. A cortiça é um deles.
APCOR – Como encontrou a cortiça?
Yemi Awosile – Encontrei alguma informação sobre a cortiça na Internet, nomeadamente no site da APCOR e da empresa Amorim. Não consegui encontrar bibliografia sobre esta temática.

E como nasceu este desejo de trabalhar a cortiça?
Antes de descobrir a cortiça, trabalhava com couros duros. Tenho particular interesse pela sustentabilidade e produtos naturais. Há cerca de três anos, deparei-me com a cortiça em materiais de livraria. Alguém mencionou que a cortiça era um produto sustentável, mas o meu conhecimento sobre o produto era muito limitado. Apenas associava a cortiça a rolhas ou a memo-boards. Após alguma investigação, descobri que podia usar a cortiça sem qualquer sombra de dúvidas. Fiquei fascinada com as fotografias que vi do descortiçamento e com o tempo que era necessário despender até obter uma rolha de cortiça. Fiquei, também, muito entusiasmada com a sua diversidade e as suas propriedades únicas. Quando partilhei esta informação com outras pessoas percebi que o conhecimento delas sobre a cortiça também era muito limitado. No Reino Unido, a cortiça foi muito usada em design de interiores até aos anos 70, mas nos últimos tempos deixou de se ver essa utilização.
Durante o meu ano de mestrado, propus uma visita de investigação a Portugal. Com o apoio da universidade ganhei uma bolsa que me permitiu estar um mês no coração do mundo da cortiça. Pude ver o descortiçamento de perto e conviver com produtores e industriais locais. Fiquei extremamente surpreendida com o facto de as árvores serem descortiçadas sem qualquer dano.
Vindo eu de uma grande cidade, fiquei apaixonada pelo poder da natureza e pelos sábios conhecimentos dos portugueses que lhes permite explorar este fonte de riqueza sem danificar o ambiente.
Quais são as principais qualidades da cortiça como matéria-prima? E como estas são fundamentais para o desenvolvimento do seu trabalho?
A indústria têxtil é responsável por produzir bastante lixo prejudicial. É importante saber que o material que eu uso provém de uma fonte renovável e sem prejuízos para o ambiente. Nos dias de hoje é muito importante para os designers incorporar no seu trabalho estas preocupações, uma vez que estamos a viver um tempo em que a nível ambiental o mundo está a sofrer alterações e já estamos a sentir os problemas relacionados com as mudanças climatéricas. Gosto do facto de que quando mais cortiça descortiçamos, mas CO2 é absorvido da atmosfera; e, ao mesmo tempo, não podemos consumir toda a cortiça que desejemos, porque temos sempre de esperar nove anos para a poder voltar a descortiçar. Para além de tudo isto, a cortiça ajuda na preservação do habitat natural. As outras indústrias deveriam aprender muito com a indústria de cortiça.
Quanto às características intrínsecas da cortiça, posso afirmar que ela é um material excelente para trabalhar, porque é flexível, leve, macia, qualidades imprescindíveis para um designer têxtil.
Há quanto tempo já trabalha a cortiça?
Trabalho a cortiça há cerca de 18 meses. Desenvolvi um trabalho muito interessante enquanto estava a estudar no Royal College of Art (em Londres) no primeiro ano do meu curso.
Que tipo de produtos desenvolve e quanto podem custar?
Eu desenvolvi tecidos para revestir interiores ou para a moda, mas ainda estou numa fase embrionária do meu trabalho. Por isso, neste momento, ainda, é um pouco cedo para falar de valores.
Que projectos está envolvida? Ganhou algum prémio com eles?
Posso referir três projectos. Enquanto estive em Portugal conheci a designer portuguesa Ana Mestre que estava a organizar um concurso para designers sobre a cortiça juntamente com a Universidade de Delft, na Holanda. Participei neste evento e foi bastante interessante estar entre os vencedores do concurso juntamente com outros três grupos. Também, em 2008, recebi um prémio da Valpack relacionado com a reciclagem. O prémio da sustentabilidade foi aberto aos alunos e foi pedido que se avaliasse em termos de eco-design. A chave deste prémio era reduzir a pegada de carbono da sociedade pelo design. Ganhei o segundo prémio. Pode encontrar mais informação em http://www.valpak.co.uk/nav/page2052.aspx .
Depois da minha licenciatura tornei-me a primeira investigadora de materiais do Royal College of Arts. Isto tem o apoio do London Design Festival e permite uma bolsa de nove meses que me ajuda a continuar com o meu trabalho.
Quais são os seus planos para os próximos tempos?
A aliança anglo-portuguesa entre Inglaterra e Portugal é a aliança mais antiga no mundo. Foi assinada em 1373 e continua até aos dias de hoje. Estou à procura de um investimento que me permita abrir um estúdio de trabalho, um centro de informação sobre a cortiça e desenvolver material que permita representar e promover a cortiça em Londres. Gostava, também, de poder evoluir nos meus projectos e torna-los acessíveis de usar a um conjunto mais alargado de acessórios.

Perfil
Yemi Awosile tem 24 anos de idade e reside em Londres. Os seus estudos na área das artes e design iniciaram-se em 2002 no Central Saint Martin’s College of Art, Art Foundation, tendo-se licenciado entre 2003/2006 em Design Têxtil pelo Chelsea College of Art and Design. De 2006 a 2008 realizou um mestrado em Fabricação de Tecidos, no Royal College of Art.
Participou em 2007 na exposição Global Cities, em colaboração com o British Architect Nigel Coats na galeria Tate Modern, em Londres, e um ano depois esteve presente na exposição Living Proof, London Design Festival, e na exposição do concurso Design Cork for Future Innovation, em Lisboa.
Já conseguiu arrecadar três prémios, a saber: vencedora do Marianne Straub Travel Prize, segundo prémio do Valpak Sustainability Award e vencedora do Dutch Design Cork Event.
O seu trabalho está disponível aqui, possuindo, ainda, uma página pessoal na Internet.
Entrevista Notícias APCOR nº 55 Ano: 2009